sábado, 20 de novembro de 2010

Diário de uma velhinha caduca


Essa é a primeira página do meu diário. Interessante porque são as últimas da minha vida. Vida mesmo que eu só tive até meus 55, e olhe lá, agora já estou com 73. Vi uma notícia no jornal de hoje que um velhinho com essa mesma idade foi pego com não sei quantos kilos de maconha. Pensei: sacanagem.

Meu carro quebrou ontem (sim! eu ainda dirijo!), meus ossos ainda não estão se quebrando e o grau da minha miopia é praticamente o mesmo desde os meus 8 anos de idade. Estou velha. Como meu carro quebrou, tive que pegar um ônibus hoje. Tou aposentada, então fui pegar ônibus pra ir pra onde? Não sei. Me deu uma vontade de me aventurar. Vontade que quase passou quando cheguei no ponto do ônibus. Eu com minha carteirinha velha de identidade abanando loucamente lá de trás na espera da porta se abrir. Imagina que eu nunca fiz isso. Pensei que não existiriam situações inéditas para uma pessoa com 73 anos de vida. Finalmente um cristão abriu a porta de trás, que eu nem sei mesmo se era cristão (como se me importasse). O ônibus não tava lotado, digo, não tinha gente em pé, ao que me parecia eu seria a primeira a ficar. Mas, uma garota não me deixou nem ao menos pensar nessa condição direito. Eu subi com um pouco de dificuldade aqueles degraus, certamente eles nunca foram tão altos. Ela me viu e foi logo se levantando e cedendo o lugar. Agradeci com um sorriso de vovó e sentei. Estranho me ver como vovó. As pessoas me veem como vovó como eu via as senhoras da minha idade como vovó quando eu era adolescente/adulta. Hoje eu que tenho pregas no rosto, cabelo branco e tudo caído. Deixei de ser mulher pra ser vovó. E isso é mais triste do que parece. Me lembro dizendo que queria morrer cedo pra um amigo, que já faleceu por coincidência, em nossas conversas absurdas no banheiro do velho apartamento, enquanto ele refutava meus argumentos cantando que envelhecer era a coisa mais moderna dessa vida e que queria saber como era, e eu que nunca disse isso, tou sabendo mais que ele. E comprovei: a velhice é uma fase solitária.

Odeio acertar nas besteiras imaturas que eu saio falando por aí. Por isso comecei a escrever nessas páginas. Envelhecer é angustiante. Já não tenho medo da morte, ando é curiosa pra saber se dói. E há quem diga que é uma fase bonita, de descobertas, experiência. Experiências eu tive há muito e queria ter muito mais. Coisas que só seriam reais prazeres na minha preciosa juventude. Tudo passou. E faz um certo tempo que não sinto sensações de juventude. O Chaves que me desculpe, mas a mente tende a acompanhar o corpo...
Essa viagem de ônibus pareceu o início do fim.

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