quinta-feira, 14 de abril de 2011

Mulher de 79 anos morre de angústia


      Quem sou eu? Não é uma pergunta retórica. 
     Uma mulher de 79 anos que passou 49 esperando ansiosamente para morrer não parece ser ninguém muito importante ou impressionante. Ainda espero, se escrevo. Quarenta e nove anos sem sentir um gosto, pelo menos bom, em viver. Difícil admitir isso. Difícil organizar palavras para transmitir "sem tirar nem pôr" essa minha angústia que percorre décadas. Não sou capaz nem de inventar outro nome, outra idade, outro contexto e outros personagens para a trama, já que isso é tão meu que não consigo alhear. Sem falar que é melhor falar dos personagens que conheço, porque tenho até medo de pensar nos demais que povoam esse mundo. Dá uma aflição. Em tu não dá não?

      Esse mundo tá mesmo amarelo. Eu reclamo da comida que minha filha traz na marmita diariamente. Tanto ela traz a marmita diariamente como eu reclamo diariamente. Sabe como é, né? Preciso botar pra fora esse engasgo de vida. Preciso vomitar minha inquietação diante da simplicidade forçada de tudo. Também não quero que ninguém saia de casa. Ninguém passeia! Todos fiquem comigo, em silêncio, desfrutando de sua própria solidão, por favor! É pedir muito?

      Na hora que acontece os acontecidos não temos noção do todo. Só depois que vira história. A minha estória foi triste e acabou há muito tempo. Há 49 anos foi escrito: "etc" para resumir o que aconteceu até hoje. O intuito não é contar cinquenta anos da minha vida, e sim falar o quanto é caótica essa invenção que é viver e fazer pensar: o quanto você ainda pode fazer, pensando fora dos seus "limites". Conclua: "não tenho limites". São só linhas imaginárias, como as que tem no globo terrestre de plástico empoeirado nesta biblioteca: greenwich, equador.

     Que sorte a sua de ler o que eu passei 49 anos para descobrir. Ainda assim em mim está só a teoria, não tenho mais força de vontade nem disposição física pra isso. Minha vida é passado. Meu presente é essa cadeira de balanço e meus crochês. Minha vida foi tudo o que eu deixei lá atrás. Você escolhe até suas escolhas. Depende da sua mente. Da sua fantasia.

     Eliminei meus contatos afetivos porque me tornei uma velha chata e difícil de aguentar. Mostro pros meus filhos e netos diariamente como não se deve viver e repito como essa comida é horrível só para ouvir em contrapartida, que para eles, "é o melhor almoço da redondeza". Tenho certeza que não é de hoje. "Requentada".

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